Twin Peaks, Washington (EUA)

Paisagens de postal, boa gente, tarte de cereja. É difícil o visitante não se apaixonar por esta pequena cidade entre montanhas. Mais complicado poderá ser sair de lá – em particular para quem se aventurar pelos bosques de Ghostwood

Bem-vindos a Twin Peaks, lê-se no letreiro rústico de madeira, à beira da State Route 21. Em redor, uma paisagem encantadora, florestas de magníficos abetos-de-Douglas reflectidas nas águas do Black Lake e, ao fundo, sempre presentes, os picos gémeos de White Tail e Blue Pine que dão nome à pequena cidade do estado de Washington.

«Bem-vindos», diz o letreiro, e a mensagem parece sincera, a avaliar pela gente com que o forasteiro se cruza na rua, no café, na bomba de gasolina. Um sítio onde «a vida tem significado, toda a vida», terá dito Dale Cooper, o agente de FBI que aqui esteve em trabalho no final dos anos 1980 e acabou por se tornar «embaixador» dos encantos da pequena comunidade madeireira. A mesma placa indica uma população de 51.201, e isso já se torna mais difícil de acreditar quando se toma o pulso à cidade, um punhado de ruas de casas baixas que em coisa de uma hora se atravessa a pé de ponta a ponta. Isto para não falar na familiaridade de um sítio onde toda a gente se conhece pelo nome.

Twin Peaks Grémio Geográphico
Uma fatia de cherry pie e uma caneca de café: o melhor ponto de partida para descobrir Twin Peaks é o diner RR, «o sítio para onde as tartes vão quando morrem».

Uma das melhores moradas para tomar contacto com essa relação comunitária é o RR (lê-se «Double R»), um diner que tem empregadas de uma invulgar beleza clássica e uma tarte anunciada como a melhor cherry pie do estado de Washington e arredores. Aliás, em matéria de tartes, há muitas recomendáveis na lista. Citando Cooper, «este deve ser o sítio para onde as tartes vão quando morrem».

O estilo decorativo lodge repete-se por toda a cidade, coroado com uma curiosa obsessão por cabeças de veado – que tanto se encontram a enfeitar as casas como na esquadra de polícia, no banco ou no hospital.

Não muito longe fica outro dos poisos favoritos locais, o Roadhouse, bar de música ao vivo, muito frequentado por motards e ocasional cenário de pancada, mas faz tudo parte do encanto (recomenda-se cautela com o barman, Jacques, que tem fama de drogar as bebidas). Quem chegar em busca de diversão mais… «adulta» poderá sempre cruzar a fronteira canadiana, que fica a apenas 8 quilómetros, e ir ao infame One-Eyed Jack, um casino/bordel cheio de raparigas em trajes vitorianos e decoração em tons de madeira, ao estilo lodge de montanha.

The Great Northern, Twin Peaks
A panorâmica sobre a cascata White Tail é um grandioso motivo para ficar no hotel The Great Northern.

Aliás, o estilo decorativo lodge repete-se por toda a cidade, coroado com uma curiosa obsessão por cabeças de veado – que tanto se encontram a enfeitar as casas como na esquadra de polícia, no banco ou no hospital. E nos quartos do The Great Northern, o hotel-postal onde todo o visitante deve ficar hospedado. Não só pela magnífica panorâmica sobre a cascata White Tail como pela qualidade do café servido ao pequeno-almoço e pelo sossego – quando não há grupos de homens de negócios islandeses alojados. Convém também referir que o serviço de quarto não é muito atencioso, já que um hóspede pode estar no chão a esvair-se em sangue e o «detalhe» passar despercebido. Boa gente, ainda assim.

No entanto, nem todos em Twin Peaks partilham das qualidades humanas exaltadas pelo agente Cooper. Apesar dos atractivos da Ghostwood National Forest (e dos misteriosos petróglifos da Gruta das Corujas), o visitante deve evitar a todo o custo aventurar-se por estes bosques, assombrados desde que há memória por uma «presença», o mesmo é dizer, um portal interdimensional para um mundo bem menos bucólico – onde, também aí, toda a gente se conhece pelo nome, mas a vida poderá não ter o mesmo valor.


O primeiro episódio da série de culto Twin Peaks foi para o ar a 8 de Abril de 1990. E mudou para sempre o mundo da televisão, com uma das narrativas mais intrigantes e perturbadoras alguma vez transmitidas, assinada por David Lynch. Twin Peaks teve três temporadas (1990-1991 e 2017) e uma versão cinematográfica (1992).


Artigo originalmente publicado na edição de Junho de 2017 da revista Volta ao Mundo.
[O Grémio Geográphico não detém direitos sobre as imagens, propriedade da CBS/Showtime]



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