O primeiro na estratosfera, no fundo do mar e na curvatura do planeta

auguste piccard // Físico, inventor, balonista, explorador // Basileia, 1884 Lausanne, 1962 //

Óculos redondos, bigode aprumado, cabelo desgrenhado, uma testa protuberante. Auguste Piccard parece o protótipo do cientista das tiras de banda desenhada. Não é acaso: foi nele que Hergé, o «pai» de Tintin, se baseou para criar o Professol Tournesol, tirando-lhe apenas dois palmos de modo a fazê-lo caber nos enquadramentos. Auguste tinha 1,98 metros de altura. Mas metros não bastam para lhe medir a grandeza. É preciso quilómetros.

Auguste nasceu em Basileia, numa família com «antecedentes» científicos – incluindo um pai professor universitário de química. Ele doutorou-se antes em física, e em 1922 mudou-se para a Universidade Livre de Bruxelas, onde assumiu uma cadeira de física aplicada. De caminho, privou com algumas das grandes mentes do seu tempo, Einstein incluído. As peças estavam todas reunidas.

Em 1953, bateu o recorde de profundidade, a bordo de um mini-submarino por si construído. Sete anos mais tarde, o seu filho Jacques tocou o fundo da Fossa das Marianas, o ponto mais baixo do planeta.

Mais do que um teórico, Piccard era também um engenheiro, um mecânico e um aventureiro sem receio de testar as suas invenções. Em 1931, com financiamento do Fundo Belga para a Investigação Científica, fez história pela primeira vez. Sob o propósito de estudar a actividade dos raios cósmicos e testar a teoria da relatividade, desenhou e construiu um balão de hidrogénio de cabine pressurizada (precursora das cabines da aviação moderna) e subiu à estratosfera, atingindo os 15.780 metros. Não só chegou onde nenhum homem chegara antes (em 1932, novo recorde: 16.201 metros), como foi o primeiro a observar, com os seus próprios olhos, a curvatura da Terra.

Num esforço de última hora para travar o voo de Piccard, as autoridades exigiram-lhe e ao seu co-piloto, Paul Kipfer, o uso de capacetes. A senhora Piccard improvisou com o que tinha à mão: cestos de vime e almofadas.

Conquistado o ar, virou-se para as profundezas. Em meados dos anos 1930, dedicou-se à adaptação da sua cápsula pressurizada e dos princípios do balonismo para a criação de um veículo de exploração do fundo do mar. Com a II Guerra Mundial pelo meio, os seus planos sofreram um revés, mas em 1948 concluía a primeira versão do seu mini-submarino.

No seu balão de cabine pressurizada, precursor das cabines da aviação moderna, a 15.780 metros do chão, tornou-se o primeiro humano a certificar-se com os seus olhos da forma redonda da Terra.

Após vários testes sem piloto, em 1953 o batíscafo descia, ao largo de Nápoles, até à profundidade inédita de 3150 metros abaixo da superfície, comandado por Piccard e pelo seu filho Jacques – que, sete anos mais tarde, atingiria o ponto mais baixo do planeta, na Fossa das Marianas. Auguste já não o acompanhou, mas ainda viveu para testemunhar essa vitória. E decerto rejubilou. Não pela proeza, mas pelo contributo: «O meu objetivo não é quebrar recordes», disse a um jornalista nos anos 1930, «mas sim abrir caminho para nova investigação científica.» Missão cumprida.


Artigo originalmente publicado na edição de abril de 2016 da revista Volta ao Mundo
[imagens propriedade do Bundesarchiv – Arquivo Nacional da Alemanha, retiradas da Wikipédia]



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